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O quase feriado de 29 de março

O dia do aniversário de Curitiba não é de descanso, mas o da padroeira, 8 de setembro, sim. Saiba por quê

O aniversário de Curitiba é comemorado no dia 29 de março ou em 8 de setembro? A confusão é natural para quem não é curitibano de berço e isso acontece porque o dia 29 de março é um dia de trabalho normal para o setor privado, enquanto o dia 8 de setembro é um feriado “enforcado”, junto com a folga de 7 de setembro, da Independência do Brasil.

Mas por que isso acontece? A reportagem lançou-se ao desafio de responder a questão e investigar esse fato curioso da história da cidade, que nas últimas semanas intrigou historiadores e diversas fontes a quem o repórter recorreu até se chegar a uma resposta.

Na verdade, o dia 29 de março deveria ser feriado para os setores públicos e privados da capital paranaense. Isso porque a Lei Municipal 229, de 26 de dezembro de 1949, sancionada pelo então prefeito Linneu do Amaral, declara feriado municipal o dia 29 de março, “data de fundação de cidade”. No entanto, não existem informações se o feriado chegou a ocorrer na prática. A Câmara Municipal não registra, por exemplo, nenhuma lei posterior alterando o texto de 26 de dezembro de 1949. O que sabe é que, nos últimos tempos, o dia 29 é considerado ponto facultativo para os servidores públicos.

E por que a data de 29 de março? O professor Luis Fernando Lopes Pereira da Universidade Federal do Paraná conta que normalmente as cidades comemoram seus aniversários nas datas em que foram elevadas no período colonial à condição de vila, o que acontece quando da elevação do pelourinho (símbolo do poder régio). Mas em Curitiba foi um pouco diferente. A data foi criada por meio de um projeto de lei de autoria do historiador e um dos principais nomes do movimento paranista, Romário Martins.

Pelourinho

O Pelourinho de Curitiba teria sido construído em 4 de novembro de 1668, onde hoje é a Praça José Borges de Macedo e era um poste de madeira com argolas de ferro, erguido em praça pública, onde os condenados pela justiça eram amarrados e chicoteados. Era um símbolo de opressão do governo português que deixou definitivamente de existir em 1822, após a Independência do Brasil.

Mesmo com a instalação do pelourinho, a localidade ainda não poderia ser elevada a categoria de vila antes que fosse realizada a eleição para a Câmara de Vereadores. Até então a região era considerada, segundo bibliografia histórica, apenas uma povoação.

Nesse mesmo ano, em 1668, Mateus Leme, morador da povoação desde 1661, foi nomeado capitão-povoador. No dia 29 de março de 1668, coube a ele promover a primeira eleição para a Câmara de Vereadores e a reinstalação do pelourinho. Dessa forma, a povoação ficou habilitada a ganhar o predicado de Vila, como exigiam as Ordenações Portuguesas. Este foi marco para o início oficial da Vila de Nossa Senhora da Luz dos Pinhais. A mudança do nome da vila para Curitiba aconteceu em 1721, com a visita do ouvidor Raphael Pires Pardinho.

Mesmo assim, segundo o pesquisador Pereira, há uma contradição de datas. “Aí reside um descompasso: Curitiba recebeu seu pelourinho a 4 de novembro de 1668 e somente elegeu seus primeiros administradores a 29 de março de 1693. Em tese, a data correta poderia ser 04/11”, afirma.

Lenda

Dizem os mais antigos que a fundação de Curitiba teria acontecido com um milagre de uma imagem de Nossa Senhora da Luz, trazida pelos portugueses. A lenda consta na obra de Antonio Vieira dos Santos, de 1922. O jornalista e escritor Euclides Bandeira também a reforça no poema No seio dos Pinhais. “Tudo isso vai a esfuminhar-se em lenda.../ -Aqui!, o bugre disse e a gente aventureira/ No seio dos Pinhais, com a luz por padroeira/ Plantou de Curitiba a originária tenda.”

Feriado de Nossa Senhora da Luz vem desde os tempos coloniais

O feriado religioso – em homenagem à padroeira Nossa Senhora da Luz dos Pinhais – é comemorado desde a época colonial. “Entre as festas coloniais, a maioria era religiosa e a festa da vila era a da padroeira e desde aquela época comemorava-se em 8 de setembro. Não houve interesse, portanto, em juntar o feriado municipal com a folga nacional”, esclarece Luis Fernando Lopes Pereira, professor da UFPR.

A Câmara Municipal de Curitiba definiu, em 24 de agosto de 1967, que o dia da padroeira da cidade deveria ser guardado como feriado. Mesmo sendo anterior à Constituição de 1988, essa comemoração continua em vigor, pois está de acordo com a Lei Federal de 1995.

Curitiba não é a única capital que comemora o dia do seu padroeiro. O caso mais parecido é o da cidade do Rio de Janeiro, que antigamente se chamava São Sebastião do Rio de Janeiro. A exemplo da capital paranaense, lá é feriado no dia 20 de janeiro, data de São Sebastião, e não 1º de março, data de fundação do município.

O professor Paulo Roberto Schier, do UniBrasil, explica que, embora o feriado seja religioso e o Estado seja laico, essas comemorações são possíveis, pois envolvem o aspecto histórico e cultural das cidades que criam. “Um feriado como o da Padroeira não é estritamente religioso, ele é cultural, trata-se de uma manifestação cultural tradicional e está ligado com a história da cidade, uma vez que as comemorações acontecem desde a época colonial”. “Você não precisa ser cristão para tirar fotos no Cristo Redentor e aproveitar o feriado de São Sebastião, ou seja, é uma questão cultural, incorporada à história da cidade”, exemplifica.

Fonte: Gazeta do Povo

27/03/2015  22h00 Por: Willian Bressan

Texto publicado na edição impressa de 28 de março de 2015

Site: www.gazetadopovo.com.br/vida-e-cidadania/o-quase-feriado-de-29-de-marco-d394bzcnmxlsuta919q11esx8

 

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